A importância do aleitamento materno (1/2): barreiras laborais às mulheres

Opinião de Tiago Correia. Havendo benefícios claros da amamentação para a saúde das mães e dos bebés, os custos da proteção laboral da amamentação devem ser vistos como um investimento em saúde pública e repartido pela sociedade.

A OMS e a UNICEF instituíram a Semana Mundial do Aleitamento Materno entre 1 e 7 de agosto para sinalizar a importância do aleitamento materno, dado que, no mundo, menos de metade das crianças até aos 24 meses recebe a alimentação adequada. Recomenda-se que o leite materno seja, sempre que possível, o único alimento até aos 6 meses e que deve continuar até aos 2 anos da criança.

Os benefícios são bem conhecidos. Para a mãe, permite a regulação hormonal que atrasa a ovulação após o parto e está associado à maior proteção contra o cancro da mama e dos ovários, diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares. Para a criança, previne a má nutrição, infeções e obesidade, além de que estimula a ligação física e emocional com a mãe.

Apesar disso e por motivos diferentes, a amamentação está longe de ser um mar de rosas para tantos pais. O tom deste texto, por isso, não é de radicalização do discurso contra os suplementos alimentares nem de culpabilização das mães e pais que optam por essa via. Cada caso é sempre um caso e a preocupação com o aleitamento materno não deve ser mais um fator de stress.

Mas há condições que potenciam ou limitam o aleitamento materno e esse aspeto tem de ser discutido. Uma dessas condições diz respeito às políticas laborais. Segundo a OMS, há uma redução significativa da amamentação após a mãe retomar o trabalho e mais de 500 milhões de mulheres que trabalham estão desprotegidas no direito a amamentar. Por exemplo, em apenas 20% dos países, as entidades empregadoras são obrigadas a providenciar momentos de amamentação pagos e/ou a assegurar condições de trabalho que permitam a amamentação ou extração do leite materno.

Por este motivo, o mote da Semana Mundial do Aleitamento Materno de 2023 foi “Vamos fazer com que a amamentação e o trabalho funcionem” (Let’s make breastfeeding and work, work!). O argumento é que o aumento da amamentação exclusiva registado na última década (de 10% para 48%), não só mostra que as políticas certas fazem a diferença, mas também que o objetivo de chegar aos 70% em 2030 não se atinge sem proteger as mulheres que lutam pela sua emancipação financeira, social e familiar enquanto decidem ser mães.

O problema é pior nos países de baixa e média renda, nos quais o mínimo legal estabelecido pela Organização Internacional do Trabalho para a licença de maternidade (14 semanas de licença paga a 2/3 do salário) continua a não ser transposto para as leis nacionais ou a sofrer falhas de fiscalização.

No entanto, as organizações internacionais chamam a atenção para os países mais ricos, devido à persistência da diferença salarial entre homens e mulheres e ao aumento da precariedade laboral entre os jovens.

Estes alertam devem ecoar no caso português. Afinal, embora a percentagem de jovens portugueses qualificados esteja em linha com a média europeia (43%), a taxa de desemprego é superior (17,2% face a 14%), assim como a percentagem de trabalhadores com contrários precários tendo formação superior (39.4% face a 31.5%). O resultado não surpreende: o salário dos jovens portugueses corresponde a 70% da média europeia.

Importa responsabilizar as empresas e os decisores políticos pela proteção das condições que favorecem o aleitamento materno. Não pode persistir a ideia de que amamentar se trata apenas de uma escolha individual, cujo resultado mais não faz do que desincentivar, culpabilizar e frustrar.

Nisto, os ministros da saúde e a DGS não têm feito o suficiente. Volto à ideia de que há muito mais além da literacia e da necessidade de campanhas de informação quando o que está em causa é a falta de recursos para que as pessoas optem por escolhas saudáveis.

Havendo benefícios claros da amamentação para a saúde das mães e dos bebés, os custos da proteção laboral da amamentação devem ser vistos como um investimento em saúde pública e repartido pela sociedade.

 

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